Cuidadosamente, ela entrou no banho. Tirou toda a roupa e arriscou um olhar dentro do espelho. Com calma, muita calma, sentou-se n a borda da banheira, abriu a torneira e experimentou a temperatura da água. Queria uma imersão morna, relaxante e perfumada.
Afinal, era chegado o dia. Ninguém sabia. Só ela, bem por dentro de seu corpo, imaginava e inventava sua própria tarde. Dentro da banheira, ela era a dona do mundo, a amante mais audaciosa, a rainha dos bacanais, a ninfeta preciosa ou a experiente mulher que tudo ensinava aos menininhos. Qualquer um destes papeis podia ser o seu. Tudo dependia só do dia, de sua vontade.
Ela percorreu seu corpo com as mãos, imaginou cenas, ampliou sensações, mas se guardou. Iria ao encontro dele cheia de vontades. Dengosa como uma gata, brincalhona como uma criança, alegre como um cãozinho quando seu dono chega em casa. Mesmo sem saber, ela se preparava. Queria cada dobra de seu corpo, cada pedaço de pele, cada reentrância, bem úmidos, escorregadios. Corpo e alma lavados e livres.
Intuitivamente, começou a praticar um exercício de sensibilização profunda, começando pelos dedos dos pés, subindo pelas pernas, chegando às coxas, sentindo cada milímetro daquele feixe de nervos que envolvia seu sexo, a macia firmeza de sua bunda, a barriga, os seios fartos, o pescoço, a nuca, as orelhas. Seu rosto, no fim. Em seguida, repetiu todo o percurso com uma esponja macia.
Sorriu para si mesma. Era estranho não estar inventando cenas, como das outras vezes em que se refugiava em seu próprio corpo. Hoje ela era uma só vibração. Estava pronta. Inteira.
Quem diria, ela era, na prática, recatada e tímida. Ninguém imaginava o vulcão que tinha entre as pernas, as loucas personagens nas quais se travestia quando trancada. Era-lhe difícil – como era difícil – desnudar-se, sentir-se inteiramente à vontade na frente de um homem. Mas aquela noite ela estava solar, radiante, sentia a névoa quente do verão tomando conta da cidade, deixando os corpos ainda mais nus, mais soltos e isso era bom.
Quando ela o conheceu, não foi preciso dizer nada. Sentiu. Ele também parecia saber de tudo. Ela estremeceu e se arrepiou toda quando ele beijou levemente seu rosto, sua boca, seu pescoço. Riram, os dois. Sabiam, ambos, que tinha chegado a hora. Então, foram andando em direção a qualquer lugar. Falaram de amenidades até se trancarem entre quatro paredes. Chegando ao hotelzinho, caíram um sobre o outro. Ele meio que a arrastou, meio que a carregou até a cama. Lenta, mas energicamente, eles se amaram. Ele parecia responder a cada suspiro dela, aumentando a pressão sobre seus joelhos, suas mãos, sua boca. E onde quer que a tocasse, ela incendiava. Era só o começo. Não tinham pressa alguma.
Havia uma luz pálida e estranha entrando pelas paredes do quarto e um cheiro, um gosto de sexo no ar. Deitados de costas, com a madrugada a cair, sentiram frio e se cobriram. Nenhum dos dois falou uma só palavra durante muito tempo. Ele só a apertou contra si e colocou suas mãos no meio de suas pernas. Seus lábios tocaram o pescoço dela e a beijaram, agora, suavemente, calidamente. Passeou as mãos por sobre sua cabeça, depois acariciou-lhe as costas, de uma forma tão sensível, tão tênue e delicada como ela nunca havia experimentado.
Nada a tinha atingido até então. Tinha sido virgem até aquela noite. Agora entrara num caminho sem volta, sem possibilidade de retorno. Nada mais poderia ser como antes. Tinha finalmente experimentado aquilo que alguns gostam de chamar de amor. Um sentimento que ela não conseguia classificar e arrumar em nenhum esquema já conhecido em sua mente.
Em algumas horas, havia se transformado por inteiro. Que estranho fenômeno lhe acontecera? Sentiu medo, um medo enorme, como o que sentem as crianças quando acordam de madrugada e vêm estranhas luzes entrando pelas frestas da janela a contornar fantasmas na parede.
Virou para o lado e viu aquele corpo nu – muito magro – abandonado entre suas pernas a ressonar mansamente. Ao mais leve movimento dela, ele respondia quase sem perceber, puxando-a para mais junto de si. Ela o amou tanto por mais aqueles gestos, por mais aquelas carícias tão verdadeiras!
Sim, agora ela sabia. Definitivamente, ele era o seu homem. Haveriam de viver uma grande história de amor. Tudo apenas começava. Já era dia claro, uma radiante manhã de novembro no Rio de Janeiro. E o gosto de café forte que tomaram depois num botequim da Rua da Lapa pode ser até hoje sentido concretamente em sua boca.
Que lindo.
ResponderExcluirela também escreve com pimenta... e que pimenta!
ResponderExcluirO que mais me encanta nesse ofício de escrever é a porta que se abre para todas as pessoas que podemos ser.
ResponderExcluirEscrever é a uma ponte para o infinito interno e ler, um vôo surpresa para algum lugar,qualquer um, até os que não existem!
Adorei esse vôo aqui...turismo sexual pelo mundo da Cris V.
Voyerismo puro!
Lindo demais... quem sabe, sabe.
ResponderExcluirO texto é simplesmente fantastico. Elegante e sensivel e picante. Genial!
ResponderExcluirUAL ...
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