terça-feira, 25 de agosto de 2009
Um dos meus poemas prediletos
Posso escrever os versos mais tristes esta noite/ Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada, e tiritam, azuis, os astros lá ao longe"/ O vento da noite gira no céu e canta/ Posso escrever os versos mais tristes esta noite/ Eu amei-a e por vezes ela também me amou/ Em noites como esta tive-a em meus braços/ Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito/ Ela amou-me, por vezes eu também a amava/ Como não ter amado os seus grandes olhos fixos/ Posso escrever os versos mais tristes esta noite/ Pensar que não a tenho. Sentir que já a perdi/ Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela/ E o verso cai na alma como no pasto o orvalho/ Importa lá que o meu amor não pudesse guardá-la/ A noite está estrelada e ela não está comigo/ Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe/ A minha alma não se contenta com havê-la perdido/ Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a/ O meu coração procura-a, ela não está comigo/ A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores/ Nós dois, os de então, já não somos os mesmos/ Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei/ Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido/ De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos/ A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos/ Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda/ É tão curto o amor, tão longo o esquecimento/ Porque em noites como esta tive-a em meus braços/ a minha alma não se contenta por havê-la perdido/ Embora seja a última dor que ela me causa/ e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.
Pablo Neruda.
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